Com quantos anos devo colocar meu filho na escola?
Há uma entrevista que li quando grávida que teve forte impacto nas decisões que eu e o Evandro tivemos acerca do ingresso da Catarina na escola.
Trata-se de uma orientação pedagógica fornecida por um autor americano chamado Steve Biddulph.
Ele é psicólogo infantil e autor de livros sobre a infância que particularmente me cativam porque defendem uma forma mais afetuosa e conectada de paternidade – ou seja, a mesma linha que tentamos seguir com a Catarina.
É curioso ver como a editora da revista época, que foi quem publicou a entrevista com o Dr. Steve, a mais de 10 anos, fez uma introdução bastante crítica sobre o conteúdo. Dá uma olhada:
“Um dos autores mais bem-sucedidos da psicologia infantil, o britânico Steve Biddulph, de 51 anos, não se envergonha de jogar um balde de água fria nas conquistas femininas dos últimos 40 anos. Em vez de sair para trabalhar, ele diz que as mães – e os pais também – deveriam ficar em casa com seus filhos até eles completarem 3 anos. O motivo é a inadequação das creches modernas às necessidades das crianças dessa idade, que, segundo Biddulph, precisam muito mais de amor e carinho do que de brincadeiras com gente estranha”.
A jornalista foi bem clara acerca da posição dela sobre os direitos da mulher a uma vida fora de casa e é exatamente esse discurso duro de que mulher só é livre quando busca sua autonomia fora de casa que me trouxe sentimentos de receio no compartilhamento da matéria do Dr. Steve.
O tempo mostrou-me que a melhor maneira de nos posicionarmos acerca de algum assunto é conhecer os vários pontos de vista sobre ele. Isso porque, analisar a coisa com base apenas nos argumentos que são favoráveis às minhas convicções primárias é por demais empobrecedor, porque reduzo-me a mim mesma e perco o enriquecimento que vem do diálogo com outro, do contraponto –, que pode fazer eu mudar de ideia ou manter o que já tinha, mas dessa vez com muito mais corpo, mais embasamento e maturidade sobre o tema.
Eu não desconheço, tampouco ignoro os avanços femininos no mercado de trabalho e sobre isso acredito que ainda há muito a progredir. Mas acredito que o discurso feminista esbarra no abuso quando avalia como menor as mulheres que optaram (e podem) investir seu tempo nos cuidados da casa e da família.
Esse preconceito tão enraizado na nossa geração já me trouxe perturbações e as vezes ainda incomoda – devo admitir…
Quando me vejo incomodada com essa vida que eu mesma escolhi, ou seja, de cuidar da casa e da família, sinto uma mistura de tristeza e alegria. Ora tristeza porque me sinto menor que as outras mulheres que saem em busca de “próprio” dinheiro; ora privilegiada por poder cuidar, eu mesma, da minha casa e da minha família.
Essa dualidade de sentimentos tem apenas uma fonte: o estigma criado de que mulher que fica em casa é “Amélia” e que, nessa condição, é menor que as outras.
Há dos tipos de mulheres que vivem a condição de “rainhas do lar” –, as que são por pura falta de opção e as que optaram por isso. Isso porque existem, claro, realidades, necessidades e configurações familiares totalmente diversas e para aquelas que podem escolher entre ficar em casa ou sair para trabalhar, têm condição de vida de evidente privilégio.
Ocorre que não é incomum vermos mulheres que podem e dedicam seu tempo aos cuidados da família sentindo ansiedade para colocar seus filhos, ainda bebês, numa creche.
Criou-se uma ideia de que quanto antes uma criança for apresentada aos números, letras e até outro idioma, melhor. Eu mesma já cansei de ver mães esnobando os filhos pequenos que já sabem escrever o próprio nome e falar algumas palavrinhas noutro idioma como se isso fosse sinal de capacidade intelectual exacerbada ou liderança de competitividade no, ainda distante, mercado de trabalho.
Para refletir com seriedade sobre isso precisamos ouvir, como disse acima, os argumentos favoráveis e contrários sobre o tema.
Dr. Steve trás o contraponto do que estamos acostumados a ouvir e depois de pensar mais sobre esse assunto conclui que vale a pensa compartilhar a matéria com vocês.
Com a pandemia, muitos pais estão executando seus trabalhos de dentro de casa. Com uma boa administração do tempo é possível proporcionar aos nossos filhos a atenção de que tanto precisam, ainda que para isso haja aumento do consumo de café e certa baguncinha na casa – detalhes insignificantes quando comparado aos benefícios de uma criança criada com afeto e presença efetiva dos pais.
Se você pode, aproveite ao máximo a infância do seu filho porque ela passa muito rápido e infelizmente não volta.
Fonte da entrevista: http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDR80005-9556,00.html
ÉPOCA – Estudos dizem que as crianças devem ir para a escola quanto antes. Por que o senhor discorda?
Steve Biddulph – Bebês não foram feitos para ir à escola nem para ser cuidados em grupo. Eles crescem e aprendem melhor quando têm um ou dois adultos cheios de amor exclusivo. Minha pesquisa é clara nesse sentido: até os 3 anos de idade da criança, é a família que tem condições de interagir com ela para um bom desenvolvimento cerebral. Ou seja, com intensidade e sintonia. É assim que o bebê aprende a se aproximar e a criar empatia – e adquire o que chamamos mais tarde de “inteligência emocional”. A melhor hora de colocar a criança na escola é a partir dos 3 ou 3 anos e meio. O certo é começar com três manhãs por semana de jardim-de-infância, com atividades educativas. Isso é bem diferente de deixar a criança todos os dias numa creche de período integral.
ÉPOCA – Qual a importância da adaptação escolar no aprendizado da criança?
Biddulph – Estudos sobre estresse e níveis de cortisol no sangue mostraram que bebês na fase de aprender a andar sofrem o dobro de estresse quando são separados da mãe e inseridos numa creche. Foi constatado que por meses o nível de cortisol se mantém alto. Sabemos que cortisol elevado faz mal, porque atrasa o desenvolvimento do cérebro, atrapalha o sistema imune e até reduz o crescimento. Os estudos constataram que as crianças que aparentavam bem-estar, na verdade, permaneciam estressadas – elas aprenderam a esconder a emoção e a lidar com ela. É importante lembrar que, nessa fase, a idade e o preparo são cruciais. O que pode ser valioso e excitante para uma criança de 5 anos pode ser devastador e traumático para outra de 1 ano e meio. Desenvolvimento infantil é isso: a coisa certa na hora certa.
ÉPOCA – Pesquisas demonstram que as crianças se desenvolvem melhor quando são estimuladas a ganhar independência. Como oferecer a elas essa oportunidade sem prejudicá-las?
Biddulph – Dos 3 anos em diante, elas começam a brincar socialmente. Antes disso, elas na verdade vêem outras crianças mais como fontes de concorrência e ameaça que como companhia. Quem brinca com as crianças pequenas são as mais velhas ou os adultos. Você não vê bebês tomando conta uns dos outros. Eles apenas brigam. Forçar essa interação social pode atrapalhar o aprendizado, de acordo com estudos internacionais que acompanharam milhares de crianças. Eles descobriram um fator de risco triplo: as muito novas que vão à creche com freqüência e passam muitas horas ali se tornam agressivas, ansiosas e desobedientes. E perdem o vínculo com a mãe. É importante ver isso em perspectiva. O número de crianças “desajustadas” cresce de 6% (em lares de bebês criados em casa) para 17%, nesses casos. Os pesquisadores acreditam que provavelmente toda criança criada em creche é de alguma forma prejudicada. Mas não criemos pânico. Pôr seu filho numa creche não é crime, mas é uma opção menos valorosa.
ÉPOCA – O que há de errado com as creches?
Biddulph – Para algumas crianças, pode ser uma experiência triste e danosa. O que se aprende nos primeiros anos de vida é a socialização: como confiar, se sentir seguro e ser alegre. Esse aprendizado é precioso demais para colocá-lo em risco no ambiente caótico de uma creche, barulhenta, com crianças demais. As creches estão distantes da imagem idealizada que elas vendem. A equipe muitas vezes é desqualificada, e os profissionais mais atenciosos costumam estar ocupados e estressados. Ali, as crianças são tratadas como grupo e não podem ser amadas ou cuidadas individualmente. As interações amorosas que elas têm com a mãe e o pai centenas de vezes por dia acontecem menos de 20% do tempo na creche. Estudos com gravações em vídeo mostram que bebês nessa situação acabam desistindo de pedir atenção e tornam-se depressivos. Ficam quietos e aí são considerados bons bebês.
ÉPOCA – Como pais que trabalham o dia inteiro podem dar atenção suficiente aos filhos pequenos?
Biddulph – O direito à maternidade e à paternidade é uma questão de justiça social. Em algumas sociedades, como nas Filipinas e na África do Sul, os pais são forçados a viver longe dos filhos por razões econômicas. É muito triste. Essa é a tragédia da industrialização. Em todo o planeta, famílias têm sido devastadas por modelos assim. Na vida em comunidade e nas aldeias indígenas, as famílias ficam unidas durante o dia. Os avós são tão bons quanto os pais, e parentes fazem um trabalho melhor que qualquer creche na maior parte dos casos. É por isso que estou fazendo campanha. Até as pessoas mais ricas têm seu papel nessa mudança, pois dão o exemplo. Nos países ricos, são os ricos que põem suas crianças em creches e têm menos tempo para cuidar delas. As pessoas pobres detestam ficar separadas de seus filhos e tendem a preferir que um membro da família tome conta das crianças enquanto trabalham.
ÉPOCA – O senhor está sugerindo que mães que colocam seus filhos em escolas os amam menos?
Biddulph – A oferta de babás baratas para mães ricas nos países em desenvolvimento é uma tentação. Enquanto a mãe cuida da casa, a babá cuida do bebê. Como o bebê interpreta isso? Como se ele fosse tão importante quanto a faxina? Ser mãe ou pai não é coisa fácil: é algo para aprender. Se deixar a criança em uma creche for inevitável, os seguintes fatores devem ser levados em conta: quanto menos crianças por cuidador, melhor; equipe perene (para uma relação estável) e cuidadores bem pagos (para que eles se sintam bem ali). Minha pesquisa mostrou o efeito das horas em uma creche sobre as crianças. Até 1 ano de idade, não se recomenda creche por nem um minuto. Até os 2 anos, dois dias curtos (meio período) por semana. Até os 3 anos, três dias curtos por semana são aceitáveis.
ÉPOCA – Em seu livro, o senhor afirma que “tudo de que os bebês precisam é amor”. Como eles experimentam esse amor?
Biddulph – Amor tem a ver com tempo. Quando você vê um pai amável com seu filho de colo, o tempo escoa, parece lhe restar todo o tempo do mundo. A pressa é inimiga do amor, porque o corrói e destrói. Temos de combater isso para proteger pais e filhos do estresse. Quando somos amados, nossas emoções são apaziguadas. Há muita risada, música e cantoria. Aprendemos a nos recuperar do estresse rapidamente. É difícil tornar-se amável sem ter passado por essa experiência. E a melhor fase para sentir isso é na primeira infância, nos braços dos pais. É quando se desenvolve a parte do cérebro que ama: o córtex frontal, que reconhece um sorriso, aprecia um afago, vê o mundo como seguro e interessante.
O que você achou dessas orientações do Dr. Steve? Vamos conversar mais sobre isso – será enriquecedor para mim e para você 🙂 .